GUSTAVO GANTOIS
Por unanimidade, os
ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) consideraram constitucional o
sistema de cotas raciais para ingresso de alunos afrodescendentes em
universidades públicas. A votação, que terminou com 10 votos favoráveis e
nenhum contrário, foi encerrada por volta das 20h10 desta quinta-feira com
pronunciamento do presidente da Corte, Ayres Britto. "O Brasil tem mais um
motivo para se olhar no espelho da história e não corar de vergonha",
disse o ministro ao proclamar o resultado.
O julgamento teve
início na quarta-feira quando Ricardo Lewandowski, relator da ação do DEM
contra o sistema de reserva de vagas da Universidade de Brasília (UnB),
rejeitou o pedido do partido político e reconheceu a constitucionalidade do
ingresso. O sistema da UnB prevê a destinação de 20% das vagas do vestibular a
candidatos autodeclarados negros ou pardos. A universidade defendia que isso
soluciona uma desigualdade histórica. O DEM, por sua vez, afirmava que o
sistema fere o princípio da igualdade e ofende dispositivos que estabelecem o
direito universal à educação.
Por volta das 19h,
o ministro Celso de Mello deu início a sua fala, favorável ao modelo adotado
desde 2004 pela Universidade de Brasília (UnB). Antes dele, Marco Aurélio
considerou constitucional as cotas. Gilmar Mendes deu o sétimo voto favorável,
mas disse que é necessária a revisão do modelo de cotas com uma ressalva ao
voto do relator Ricardo Lewandowski.
O ministro Luiz Fux
foi o primeiro a se pronunciar nesta quinta-feira. Elogiando o voto do relator
feito ontem, Fux definiu que ações afirmativas ainda são necessárias em um País
com desigualdades sociais tão grandes como o Brasil. "A opressão racial
dos anos da sociedade escravocrata brasileira deixou cicatrizes que se refletem
no campo da escolaridade. A injustiça do sistema é absolutamente
intolerável", disse.
Confusão
Quase ao final de seu voto, o ministro Fux foi interrompido por um índio que protestava dentro do plenário pela inclusão da etnia nas discussões sobre o sistema de cotas. Identificado como Araju Sepeti, o índio guarani de Mato Grosso chamou os ministro de racistas e urubus e foi retirado pelos seguranças da Corte.
Quase ao final de seu voto, o ministro Fux foi interrompido por um índio que protestava dentro do plenário pela inclusão da etnia nas discussões sobre o sistema de cotas. Identificado como Araju Sepeti, o índio guarani de Mato Grosso chamou os ministro de racistas e urubus e foi retirado pelos seguranças da Corte.
Após a retomada da
sessão, Fux disse que "a ansiedade é o mal da humanidade" e então
citou o direito dos indígenas, conforme tinha pedido o índio retirado do
plenário.
A ministra Rosa
Weber, por sua vez, afirmou que não se pode dizer que os brancos em piores
condições financeiras têm as mesmas dificuldades dos negros, porque nas esferas
mais almejadas das sociedades a proporção de brancos é maior que de negros.
"A
representatividade, na pirâmide social, não está equilibrada. Se os negros não
chegam à universidade, por óbvio não compartilham com igualdade de condições
das mesmas chances dos brancos. Se a quantidade de brancos e negros fosse
equilibrada, seria plausível dizer que o fator cor é desimportante. A mim não
parece razoável reduzir a desigualdade social brasileira ao critério
econômico", disse a ministra.
Já na opinião da
ministra Cármen Lúcia, que votou em seguida também a favor das cotas raciais,
as ações afirmativas não são as melhores opções. "A melhor opção é ter uma
sociedade na qual todo mundo seja livre para ser o que quiser. Isso é uma
etapa, um processo, uma necessidade em uma sociedade onde isso não aconteceu
naturalmente", disse Cármen Lúcia.
Discriminação enraizada
Após um intervalo de quase 40 minutos, Joaquim Barbosa, o único ministro negro da Corte Suprema, fez um voto que não chegou a 10 minutos. Barbosa acusou que a discriminação está tão enraizada na sociedade brasileira que as pessoas nem percebem.
Após um intervalo de quase 40 minutos, Joaquim Barbosa, o único ministro negro da Corte Suprema, fez um voto que não chegou a 10 minutos. Barbosa acusou que a discriminação está tão enraizada na sociedade brasileira que as pessoas nem percebem.
"Aos esforços
de uns em prol da concretização da igualdade que contraponham os interesses de
outros na manutenção do status quo, é natural que as ações afirmativas sofram o
influxo dessas forças contrapostas e atraiam resistência da parte daqueles que
historicamente se beneficiam da discriminação de que são vítimas os grupos
minoritários. Ações afirmativas têm como objetivo neutralizar os efeitos
perversos da discriminação racial", disse Barbosa em seu voto.
O voto decisivo foi
dado pelo ex-presidente da Corte, ministro Cezar Peluso. Interrompido por
apartes dos ministros Gilmar Mendes e Joaquim Barbosa, Peluso resumiu a questão
ao afirmar que as cotas são necessárias à sociedade brasileira no atual
momento, mas que devem ser analisada no futuro para verificar se ainda atingem
o objetivo de inserir afrodescendentes em posições de mais destaque.
"Não posso
deixar de concordar com o relator que a ideia é adequada, necessária, tem peso
suficiente para justificar as restrições que traz a certos direitos de outras
etnias. Mas é um experimento que o Estado brasileiro está fazendo e que pode
ser controlado e aperfeiçoado", votou o ministro.
Tribunal racial
O ministro Gilmar Mendes criticou o fato de as políticas de cotas da UnB adotarem exclusivamente o critério racial. Ele afirmou que a política pode ser aperfeiçoada e citou o exemplo do Prouni, programa de bolsas de estudo do governo federal, que, além da raça, leva em conta critérios sociais.
O ministro Gilmar Mendes criticou o fato de as políticas de cotas da UnB adotarem exclusivamente o critério racial. Ele afirmou que a política pode ser aperfeiçoada e citou o exemplo do Prouni, programa de bolsas de estudo do governo federal, que, além da raça, leva em conta critérios sociais.
"A ideia de
tribunal racial evoca a memória de coisas estranhas. Não é um modelo. Seria
mais razoável adotar-se um critério objetivo de referência de índole
sócio-econômica. Todos podemos imaginar as distorções eventualmente
involuntárias e eventuais de caráter voluntário a partir desse tribunal que
opera com quase nenhuma transparência. Se conferiu a um grupo de iluminados
esse poder que ninguém quer ter de dizer quem é branco e quem é negro em uma
sociedade altamente miscigenada", disse o ministro, lembrando do caso
envolvendo dois gêmeos univitelinos, em que um entrou na UnB pelo sistema de
cotas e o outro foi rejeitado.
Oitavo ministro a
votar, Marco Aurélio Mello seguiu o mesmo raciocínio externado pelos ministros Ricardo
Lewandowski, Gilmar Mendes e Cármen Lúcia. Para ele, o sistema de cotas é
essencial, desde que as políticas sejam temporárias. E é válida,
principalmente, pelo que classificou como "neutralidade do Estado" em
favor dos afrodescendentes.
"A neutralidade
estatal mostrou-se nesses anos um grande fracasso. É necessário fomentar-se
acesso à educação. Urge implementar programas voltados aos menos
favorecidos", disse Marco Aurélio. O ministro Celso de Mello, decano da
Corte, citou, em seu voto, convenções internacionais que estabelecem formas de
se combater o preconceito e garantir condições de igualdade.
"As ações
afirmativas são instrumentos compensatórios para concretizar o direito da
pessoa de ter sua igualdade protegida contra práticas de discriminação
étnico-racial. Uma sociedade que tolera práticas discriminatórias não pode
qualificar-se como democrática", afirmou em seu voto.
O presidente do
STF, ministro Ayres Britto, foi o último a votar. Também favorável ao sistema
de cotas, Britto afirmou que os erros de uma geração podem ser revistos pela
geração seguinte e é isto que está sendo feito.
"Aquele que
sofre preconceito racial internaliza a ideia, inconscientemente, de que a
sociedade o vê como desigual por baixo. E o preconceito, quando se generaliza e
persiste no tempo, como é o caso do Brasil, por diversos séculos, vai fazer
parte das relações sociais de bases que definem o caráter de uma
sociedade", disse Ayres Britto.
STF julga ações sobre cotas e Prouni
Além das cotas raciais na UnB, o STF vai analisar duas ações que contestam a constitucionalidade da reserva de vagas por meio de cotas sociais e o perfil do estudante apto a receber bolsas do Prouni. A outra ação sobre cotas que aguarda julgamento foi ajuizada pelo estudante Giovane Pasqualito Fialho, reprovado no vestibular da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) para o curso de administração, embora tivesse alcançado pontuação superior à de outros candidatos. Os concorrentes que tiveram nota menor foram admitidos pelo sistema de reserva de vagas para alunos egressos das escolas públicas e negros.
Além das cotas raciais na UnB, o STF vai analisar duas ações que contestam a constitucionalidade da reserva de vagas por meio de cotas sociais e o perfil do estudante apto a receber bolsas do Prouni. A outra ação sobre cotas que aguarda julgamento foi ajuizada pelo estudante Giovane Pasqualito Fialho, reprovado no vestibular da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) para o curso de administração, embora tivesse alcançado pontuação superior à de outros candidatos. Os concorrentes que tiveram nota menor foram admitidos pelo sistema de reserva de vagas para alunos egressos das escolas públicas e negros.
Em relação ao
Prouni, implementado a partir de 2005 com a concessão de bolsas de estudo em
universidades privadas, a Confederação Nacional dos Estabelecimentos de Ensino
(Confenem) alega que a medida provisória que originou o programa não atende ao
princípio constitucional da isonomia entre os cidadãos brasileiros.
Disponível em: http://noticias.terra.com.br/educacao/noticias/0,,OI5741490-EI8266,00-Com+votos+a+STF+aprova+cotas+raciais+em+universidades.html
Acesso em 12/05/2012.
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